Tal como qualquer outro grande império centralizador e opressor, a União das Républicas Socialistas Soviéticas ruiu minada pelos enormes erros da sua cegueira dogmática e, como tal, arrogante. Acaba por acontecer o mesmo a todos aqueles que se arrogam senhores da solução final. Isso poderia levar a falarmos sobre a contínua mutabilidade do Universo; mas tal ficará talvez para outra ocasião.
E ao terminar, tudo que fora forçosa e artificialmente mantido coeso, deixa atrás de si dispersão e caos. Assim acabam os impérios. A URSS não foi excepção. Daquilo que anteriormente havia sido o orgulhoso Bloco Soviético emergiram uma série de nações orfãs, que se estendem desde a Europa Central até à Ásia Oriental. Deixadas no desamparo pela fuga duma administração ruinosa, essas nações tiveram que encontrar novos rumos.
A Mongólia é uma dessas nações orfãs. Nação orgulhosa dum passado grandioso, teve de reencontrar um rumo próprio, entalada entre dois gigantes. Mas sem as ousadias do passado, impossíveis num mundo movido agora por outros interesses e desígnios, a Mongólia teve de se reerguer da indigência deixada pelas insensatas políticas económicas do regime comunista.
Urgia recuperar o tempo perdido, de modo a conseguir um lugar entre os países de sociedades modernas de perfis dinâmicos. Mas tudo tem um preço e, esse preço recai sempre sobre as existências dos mais fracos e desprotegidos. As classes mais baixas da sociedade são as primeiras a sofrerem os rigores duma economia nacional em crise. E dentro dessas classes os mais vulneráveis são as crianças.
Desamparados à sua própria sorte muitas das crianças do principal aglomerado urbano da Mongólia, a sua capital Ulan Bator, abandonam os seios destroçados das suas famílias e deambulam pelas ruas da cidade, em busca dumas migalhas, ou mesmo recorrendo a todos os estratagemas para alcançarem os modos de sustentarem os vícios que tais sortes sempre promovem: o recurso a estupefacientes, nomeadamente o mais comum entre os mais juvenis; cheirar cola.
Mas o clima mongol é implacável. E se os Verões podem ser muito quentes já os Invernos são atrozmente gelados. E em busca de refúgio contra os seus perseguidores, que os sujeitam às mais crueis sevícias e abusos, as crianças de Ulan Bator começaram a se refugiar nos esgotos da cidade, onde encontravam abrigo e algum calor junto às condutas de vapor para os aquecimentos da cidade. Aí se reunem em pequenas comunidades organizadas do jeito cândido e ao mesmo tempo cruel próprio da infância.
E foi esse universo surreal das crianças dos esgotos de Ulan Bator que alguns membros do Cirque du Soleil foram encontrar numa visita à Mongólia. Não ficaram indiferentes; as suas consciências não os permitia. Então em conjunto com entidades oficiais locais promoveram um programa de recuperação de crianças abandonadas, tendo por base a motivação dessas crianças para as artes circenses. Não que essas artes fossem de todo estranhas na Mongólia, que já no passado possuiu um dos melhores circos do mundo.
As crianças aderiram ao envolvimento numa nova comunidade, em que os adultos passaram de ameaça a amigos. Deixaram-se aliciar pelo encanto das artes circenses, que lhes restituiu uma auto-imagem de dignidade e consequentemente um notável aumento de auto-estima. E esse trabalho abriu-lhes o interesse para se dedicarem à aprendizagem de outros ofícios, que lhes proporcionarão qualificações para uma mais fácil carreira no mundo laboral.
Alguns dos artistas do Cirque du Soleil são de origem mongol.
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2 comentários:
Este teu interessante post devolve-nos alguma esperança nos seres humanos.O que mitiga a tristeza causada pelos seus dislates e crimes.
Bem hajas.
Vim desejar -te feliz fim de semana.
Abraços.
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