sexta-feira, 7 de março de 2008

A Vida de Hoje

Despois de 10 anos de infância vividos em África (onde nasci, em Moçambique) e 40 anos em Portugal, onde me habituei aos modos de civilidade e confortos europeus, estou presentemente numa curta estadia no Rio de Janeiro (Brasil) para preparar a minha mudança para cá, com o intuito de viver aqui a segunda metade da minha vida. Por certo que com a minha idade (meio século) e a minha experiência, de uma vida disputada de olhos abertos e peito oferecido aos confrontos, não posso deixar de ter uma análise meticulosa e crítica de tudo aquilo que vou observando. Mais que não estou fazendo o usual roteiro turístico (elaborado para iludir o olhar distraído do turista), mas estou vivendo o quotidiano dos cariocas (assim se denominam os habitantes do Rio de Janeiro) que moram na periferia e se levantam de madrugada para ir ganhar o seu sustento num calor tropical. Um mundo muito diferente dos confortos duma europa esforçada em se auto-regulamentar até à exaustão quase paranóica; uma europa asséptica e desumanizada, quando comparada com o jeito desleixado e desregrado destas gentes que vivem ritmados pelo frenesim dos sentimentos e emoções mais humanamente básicos.

Ocorre-me então a comparação entre as diferentes assimetrias e comportamentos sociais dos vários povos e países espalhados por todos os continentes. E se uns pecam dum modo, outros pecam de outro; afinal todos pecamos (não estou a usar o termo "pecado" num sentido moralista-religioso). Não são os povos e sociedades com modelos de vida económica e tecnologicamente mais elaborados que vivem dum modo mais correcto que os outros. Essas sociedades auto-denominam-se de desenvolvidas, olhando para os outros modelos como sub-desenvolvidos, ou em vias de desenvolvimento. Isso criou um estigma que levou os outros povos a um abandono do desenvolvimento natural dos seus modelos próprios, instigados pela falsa abastança do modelo ocidental de civilização. Tal inversão (mais do que conversão) de modelos acarreta verdadeiras aberrações existênciais, que apenas induzem a uma vivência insalubre e desumana.

Poderia aqui politizar a questão e falar nos interesses dos governantes e dos grandes agentes económicos mundiais, mas isso seria desviar-me do meu propósito sempre primordial que é a responsabilização do indivíduo (cada um de nós) pelas suas opções e atitudes. Esses tais governantes e grandes agentes económicos não deixam de ser indivíduos em si; poderão ter mais responsabilidades na definição dos propósitos gerais, mas isso não os isola como únicos agentes nessa inversão de valores culturais dos seus próprios povos. Os povos mudam os seus comportamentos porque os indivíduos que os compõem querem essas mudanças. Induzidos pelos mais poderosos (os chamados tubarões da economia mundial)? Sim... Talvez... Mas, então, e porquê? Porque se deixam induzir?
Educação. Por falta de educação, de formação pessoal.
Cada vez mais as pessoas abdicam da sua auto-formação. Desde a mais tenra idade não somos ensinados a pensar por nós. Somos modelados a aceitar o que a norma e a regra nos impõem. E a grande maioria aceita isso por comodismo e/ou inépcia. E isso é o caminho aberto a estes mundos desumanizados em que se tornaram as nossas grandes urbes; estes descomunais antros de angústia e frustração.

É tempo de cada um de nós chamar a si a responsabilidade de assumir o seu papel neste mundo. É tempo de cada um de nós deixar de delegar a sua responsabilidade perante a vida, nas administrações e nos governos.
É tempo de cada um assumir o seu papel de Ser Humano.

3 comentários:

Anónimo disse...

Salve! Li com atenção"A vida de hoje" e não pude deixar de pensar na maneira como os europeu que se acham no primeiro mundo analisam os países da América Latina, Africa e Asia. Achei a tua visão do Brasil e dos brasileiros um pouco populista. Também existem brasileiros que vivem bem, no conforto e na riqueza. Frequentam escolas particulares, campos de golfe e têm dois ou três carros na garagem.Pobreza e analfabetos existem por todo o lado. A África está cheia deles. Na Ásia e na Europa de leste, também! Mesmo na C.E. os países estão a empobrecer, com as pessoas a fugirem para países mais afortunados, que são realmente muito poucos. Aqui mesmo em Portugal,existe miséria e analfabetos!Portugal é o país onde existem mais velhos do que jovens, mais da metade da população é desdentada porque não consegue pagar um dentista e nem um médico particular e vive em residências a cairem aos bocados, húmidas e a pagar rendas caras por essa miséria. É um país que no interior, muitas casas não têm saneamento básico e nem luz têm e tudo isto em pleno século XXI! O país está assim, mas continuamos cá a viver, a sofrer porque não é culpa do país, mas sim dos governantes. Agora não vejo lógica sair de um país que consideramos confortável, rico e moderno, para nos enfiar num país de terceiro mundo que nem sequer nos chamou e começarmos a pintá-lo de uma só cor. Em relação ao Brasil, só existe um lema:"Ame-o ou deixe-o". Fico mais chocado quando este tipo de visão vem de uma pesssoa que nasceu em Moçambique, um país que também tem problemas financeiros, pobreza, analfabetos, democracia duvidosa e os direitos da mulher e da criança nem por isso são respeitados. Mas é sempre assim, só vimos problemas na casa do vizinho. Abraços!

São disse...

Parabéns pela nova casa.

Os meus olhos ficarão bem agradecidos se separares os parágrafos.

Continuo esperando mais entradas.

Já agora, tenho pena de que o perfil de DJIAN não esteja disponível.

Bem hajs!!

BIA disse...

...Se eu tivesse mais força, neste meu meio século de existência, também dava um "pontapé na lua" e virava a minha vida de pernas pro ar...

Que mudava umas quantas coisas, se esta mudança dependesse apenas do meu querer...Ah, lá isso mudava!

Mas a vida é mesmo assim, somos "carimbados" logo à nascença. Pertença de um povo com o seu lugar, a sua herança, os seus costumes...Dificilmente nos libertamos desta terrível máquina...E quando atingimos uma certa idade, damos por nós a pensar muito mais profundamente na máquina que nos devora...
Entretanto, os filhos, a família, o carro, a casa e o ... e o... e tal... e pronto, cá estamos enrredados!

Deus queira que te dês muito bem nesta fase e nesta tua escolha, e, que sejas imensamente feliz!!!

Abracinho de peito aberto ao teu abraço

BIA